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Escola pública de Ensino Médio Integral no Amapá cria projeto de valorização e reconhecimento de heranças culturais

O projeto “Raízes” evidenciou dificuldades enfrentadas por alunos descendentes de escravizados em compreender suas origens e os lugares que ocupam em suas histórias

 

Buscando elaborar uma atividade multidisciplinar que fosse atrativa, mas ao mesmo tempo motivadora, significativa e acessível para os estudantes, os professores da Escola Estadual Maria do Carmo Viana dos Anjos, de Ensino Médio Integral (EMI) – modelo de educação público e gratuito – criaram o projeto “Raízes”. O objetivo era promover o contato entre os alunos e suas famílias, de modo que aproveitassem o tempo em casa para resgatar heranças culturais importantes, como ensinamentos e estórias passadas pela oralidade, costumes comuns no convívio familiar, comidas típicas, formas de expressão e variações linguísticas.

 

Ao mesmo passo que proporcionou um olhar interseccional entre diferentes disciplinas, o projeto também trouxe à tona alguns desafios, como a dificuldade de vários estudantes em obter o histórico de seus antepassados. Muitos não conseguiram completar sua árvore com as gerações, pois eram descendentes de pessoas escravizadas, vindos da África e outras regiões, fato este que suscitou discussões importantes entre as turmas.

 

“O intuito de trabalhar a herança cultural e linguística na atividade Raízes é valorizar e reconhecer essas questões como bens imateriais. Temos presente na nossa comunidade escolar estudantes vindos de uma árvore genealógica que possui outra língua de origem, como exemplo do francês, falado na Guiana Francesa (nossa vizinha), e também a língua índigena”, conta a coordenadora Cleide. A escola está presente em um local que divide espaço com áreas de proteção ambiental, lar de tradicionais comunidades quilombolas – comuns em todo o estado do Amapá devido à proximidade com a Guiana Francesa – das quais muitos jovens fazem parte.

A iniciativa também está ligada aos Projetos de Vida dos estudantes – uma disciplina diversificada da matriz curricular das escolas de Ensino Médio Integral, cuja finalidade é promover no aluno o entendimento de quem ele é no presente e quem gostaria de ser no futuro, incentivando o protagonismo juvenil.

“Uma das temáticas do Projeto de Vida é a identidade e a construção da personalidade do estudante. Como a proposta do EMI é focar no estudante e nos seus sonhos, pensamos em alinhar o Raízes a outras disciplinas, como filosofia, história, biologia, francês, artes e outras. Foi dentro desse contexto que montamos a ideia do projeto interdisciplinar, como uma estratégia para que o aluno encontre uma relevância e significado para aquilo que está fazendo, reconhecendo sua história”, explica a professora Rosilene, uma das idealizadoras do projeto.

Desafios e possibilidades

Devido ao contexto social onde a escola está inserida, em que uma parte considerável dos alunos não têm acesso à internet de qualidade e precisavam ir à escola buscar as atividades impressas, foi preciso criar um formato de avaliação que pudesse ser realizado de forma offline e à distância, mas ainda assim, ser impactante. Além disso, quase todo o Amapá sofreu muito fortemente com os apagões no último ano. Foram atingidos 13 dos 16 municípios do estado, durante o período de 3 a 24 de novembro de 2020, o que prejudicou ainda mais o ensino.

Para driblar estes desafios e criar novas possibilidades de diálogos, o projeto buscou utilizar os conteúdos abordados pelos professores como ferramentas para a construção e entendimento das histórias, auxiliando na interpretação e criatividade. Apoiados pelos professores-tutores e com base em documentos históricos, como: fotos e relato oral da família, os alunos desenvolvem recursos importantes para a vida pessoal e também profissional, como a biografia, a cultura e a memória.

Conheça o Ensino Médio Integral

O EMI possui uma proposta pedagógica multidimensional, que se conecta à realidade dos jovens e busca proporcionar o amadurecimento do indivíduo, com o objetivo de prepará-lo não só para o mercado de trabalho ou para o vestibular, mas também para a vida. Um modelo de ensino moderno, público e gratuito, que foca em auxiliar os jovens na construção de seus Projetos de Vida e planos para o futuro.

Em todo o Brasil são cerca de 3720 escolas no modelo e 778 mil estudantes. A modalidade apresentou crescimento exponencial no último IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), reforçando sua assertividade. Os índices de desempenho e rendimento também surpreendem. Enquanto a média nacional do IDEB foi de 3.9 pontos, o Ensino Médio Integral atingiu 4.7 pontos na média nacional, superando a meta Brasil de 4.6 pontos. Apesar de acumular os melhores resultados do Ensino Básico, o modelo, que promove a formação integral e cidadã dos jovens, ainda é pouco conhecido.

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